segunda-feira, 9 de março de 2015

O neo-namorico de portão

O Romantismo morreu. Não sob uma perspectiva literária. Falo dos meninos tímidos, com gel nos cabelos que sopram a mão a fim de testar o próprio hálito e esperam as amadas, hesitantes, portando em mãos um buquê de flores ou uma caixa de chocolate.


Este mesmo menino, contemporaneamente, só apareceria com gel nos cabelos se, por exemplo, Ronaldinho o tivesse feito na copa de 2006. O hálito estaria bom a depender da sua sorte e as flores e o chocolate só em caso de infidelidade e necessidade de reconciliação. Não se vêem mais serenatas, namoricos de portão. Os apaixonados já não correm abraçados pela areia nem nela fazem corações com palitinhos de picolé. Não se arriscam mais poemas declamados de Vinicius de Moraes. Melhor que não! Quando o fazem costumam trocar o título pela estrofe e, ainda, tomam a autoria como sua.

Antes se sentava no sofá da sala o casal sob o olhar atento e crítico da mãe, sempre naquela poltrona ao lado, forjando um bordado, geralmente, um arranjo de flores. Quando liberal, a mãe, vez ou outra oferecia uma limonada ou um bolinho de queijo que levaria mais ou menos três minutos preparando na cozinha, dando ao casal a oportunidade de, talvez, olhar-se mais profundamente, apertar com mais intensidade as mãos ou, então, o momento perfeito para o rapaz dizer alguma coisa que não poderia em outra ocasião: “Você está linda hoje”, encerrando a frase com um beijo sutil em sua face corada.Claro que essa época em que havia a preocupação da mãe entrar na sala num momento de afago e carinho já teve seu desfecho. Hoje é ela quem toma como opção não invadir o espaço, a fim de poupar-se de uma cena que pode ocasionar efeitos traumáticos.

Os tempos, definitivamente, são outros! As relações afetivas perderam o seu caráter “cor de rosa” e assumiram uma postura mais seca, mais moderna.Um fator determinante para o fim de delicadezas como, exemplo, abrir a porta de um carro para uma dama e, também, o ato de chamar uma mulher de dama, foi a mudança drástica que sofreu a educação, tanto familiar quanto acadêmica. As famílias já não são tão conservadoras, e nem seguem mais o modelo patriarcal. É normal que ambos os pais trabalhem, o que significa que a mãe não estará mais em casa para bombardear a filha de valores morais e velhos tabus aos quais deveria submeter-se cegamente. O filho não recebe as instruções de como tratar uma moça, seguindo a risca as regras básicas da boa educação. Na maioria das casas, os filhos recebem mesadas, que precisam conter e administrar durante todo o mês. Isso explica as contas de restaurante divididas, aquele final de semana que só dá mesmo para ficar em casa e os agrados materiais terem se resumido a situações de extrema emergência e importância.

Quanto à extinção das sutilezas verbais e escritas, as escolas já não tratam a literatura com profundidade. A redação é ensinada como é a matemática e os livros possuem uma linguagem didática, sem muitos floreios o que empobrece o vocabulário dito romântico.A grande verdade é que não se precisam usar mais de artifícios intelectuais para uma conquista. Criou-se um estereótipo do homem musculoso e o da mulher magra de seios fartos e pernas torneadas que, muitas vezes, é o suficiente.

O pudor dos casais em relação à sexualidade é um defunto, há muito, sepultado, se antes os homens tinham orgasmos quando acidentalmente encostavam o cotovelo no imaculado (ao menos é o que se presume) seio da namorada, hoje eles a cumprimentam com um aperto na bunda, tocam seus seios em público sob a nobre desculpa de estar“ brincando”, e fazem sexo no primeiro canto que consideram ermo, atribuindo aos seguranças de estacionamentos, lanterninhas de cinema, coroinhas da igreja o título de principais inimigos e opositores da felicidade alheia.Padece, então, a Era do Romance. Com ela todos os sorrisos de canto de boca, olhares tímidos, as juras de amor eterno, poemas improvisados, e as (que principalmente invejo) serenatas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário